Como em anos anteriores jazigo de Ana Rosa em Botucatu deverá receber muitas visitas no Dia de Finados
26/10/2021
Como em anos anteriores jazigo de Ana Rosa em Botucatu deverá receber muitas visitas no Dia de Finados

Mais de 130 anos após sua morte, é atribuído a ela dezenas de milagres e existe, desde 2012, uma movimentação de devotos que pede sua beatificação ao Vaticano

 

Já é tradição em Botucatu, no Dia de Finados, o jazigo de Ana Rosa receber centenas de visitantes de várias regiões de São Paulo que param para rezar, pagar promessas e fazer pedidos de milagres, deixando flores, cartas e placas de graças recebidas. A expectativa é a tradição seja mantida este ano e deverá ser o ponto mais visitado do Portal das Cruzes, o cemitério mais antigo e com o maior número de sepultamentos da região.

Mais de 130 anos após sua morte, é atribuído à Ana Rosa dezenas de milagres, embora ela não seja considerada santa pela Igreja Católica. Existe uma movimentação de devotos iniciada em 2012 que pede sua beatificação ao Vaticano.

A vida e a trágica e violenta morte dessa personalidade histórica foram retratadas em livro intitulado "Ana Rosa - Sua Vida, Sua História”, lançada em 1988 pelo historiador Moacir Bernardo, do Centro Cultural de Botucatu.

 

História de Ana Rosa

Na manhã do dia 22 de junho de 1885, um fazendeiro cavalgava por Botucatu, quando o animal, inesperadamente, o conduziu para um terreno nos arredores do município, próximo ao Rio Lavapés. Ali, o homem encontrou abandonado o corpo de uma mulher mutilada, sem os seios, orelhas, lábios, dedos e língua.

Graças a uma escrava fugida que viu o crime, escondida, foram reconhecidos assassino e vítima: a jovem era Ana Rosa, de 20 anos, e seu algoz era o próprio marido, Francisco Carvalho Bastos, conhecido como Chicuta, um influente carreiro com idade entre 40 e 45 anos.  O crime ocorreu de madrugada. Chicuta teria batido na mulher, cortado-a aos pedaços e matado-a aos poucos.

 

De milagreira à moda de viola

Por dezenas de anos, a história de Ana Rosa foi passada de geração em geração de forma oral, até que, em 1957, a dupla sertaneja Tião Carrero e Pardinho gravou uma música que conta a tragédia da jovem, descrevendo Chicuta como um "caipira bastante atrasado" que "batia na pobre mulher com a vara de ferrão de bater no gado". Intitulada Ana Rosa, a composição é do músico Carreirinho, nascido em Bofete, município a 45 km de Botucatu.

 

Justiceira

Ana Rosa se casou com apenas 15 anos e foi a segunda mulher de Chicuta - não há registros sobre a primeira. Nos cinco anos em que durou a união, o casal viveu em uma fazenda na região de Avaré, a 77km de Botucatu.

Cansada de apanhar e ser maltratada pelo marido, conhecido por ser agressivo e ciumento, ela aproveitou uma viagem a trabalho dele para fugir de casa, tendo recebido ajuda de um velho escravo do marido.

O escravo roubou um cavalo da fazenda e levou Ana Rosa para Botucatu, onde a moça tinha uma tia que era costureira em um cabaré, local em que também morava. O plano de Ana Rosa era passar uns dias com a tia até conseguir fugir para o Sul do país e sumir para sempre do marido.

Quando voltou de viagem, Chicuta descobriu a fuga. Matou o escravo que ajudou Ana Rosa e seguiu para Botucatu em busca da mulher. Tentou tirá-la à força do cabaré, mas foi impedido pela tia de Ana Rosa e pela dona do bordel, Fortunata Jesuína de Melo.

Furioso, Chicuta contratou dois capangas e bolou um plano: um deles, José Antonio da Silva Costa, o Costinha, se aproximaria de Ana Rosa, conquistaria a confiança da jovem e diria conhecer uma comitiva de tropeiros que poderia levá-la até o Paraná.

O plano deu certo e, na madrugada de 21 de junho de 1885, ela seguiu com o moço para a região do Rio Lavapés, direto para a emboscada que resultaria na sua morte.

Os assassinos foram a julgamento, mas Chicuta foi absolvido, alegando ter cometido o crime em defesa de sua honra. Costinha, por ser de uma família rica da região, também foi absolvido. O único condenado foi o capanga Hermenegildo Vieira do Prado, conhecido como Minigirdo, filho de escravos.

Pouco tempo depois, os três envolvidos com o assassinato de Ana Rosa também morreram de forma trágica: Minigirdo foi o primeiro, tendo contraído varíola na prisão e ali morrido. O segundo foi Costinha, que foi esmagado por uma árvore enquanto a cortava. O último foi Chicuta que, ao consertar o carro de boi em que viajava, uma das rodas do veículo passou sobre seu pescoço e o matou degolado. Devotos de Ana Rosa costumam atribuir ao espírito da moça as mortes de seus algozes.

 

Santa não canônica

Não há informações precisas sobre o início do culto em torno de Ana Rosa, santa popular que tem até uma oração própria:

"Oh! Alma piedosa de Ana Rosa, vós que tão bem conheceis os sofrimentos desta vida, intercedei por nós junto a Todos os Santos, a Nossa Senhora Mãe de Deus e a Jesus seu filho. Rogai pela diminuição de nossa provação e pela solução dos nossos problemas [pensar no problema]. Ajudai-nos a ser merecedores da Misericórdia Divina".

 

Capela

Ana Rosa tem uma capela erguida em seu nome, em 1921, no local em que o seu corpo foi encontrado, hoje o bairro da Cohab I de Botucatu. Assim como o jazigo, a capela também é pintada de rosa e mantida pelos moradores da cidade.

No âmbito judicial, a memória de Ana Rosa recebeu reconhecimento quando estudantes de uma faculdade de Direito de Botucatu promoveram um júri popular simulado do caso e condenou Chicuta a 25 anos de prisão. Canonizada ou não, o caso de Ana Rosa é atual, já que machismo e violência contra a mulher seguida de impunidade aos agressores são frequentes.


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